Governo quer reforma trabalhista logo, mas no define alcance da proposta
O presidente Michel Temer desembarcou no Brasil, depois do encontro do G-20, no meio de um cabo de guerra em relação ao calendário mais indicado para pôr em marcha as reformas da Previdência e trabalhista, eleitas pelos empresários como prioritárias para destravar a economia. Uns querem que Temer se apresse, enquanto outros preferem que ele vá mais devagar. Tudo isso dentro de um cenário de turbulências ampliadas pela volta da oposição às ruas.
A decisão de encaminhar a proposta da Previdência antes das eleições, anunciada por Temer nesta semana, é resultado de pressões do PSDB, mercado financeiro e setor produtivo. Mas está sendo vista como algo mais simbólico do que efetivo, já que, durante a campanha, os parlamentares costumam fugir de temas polêmicos para não espantar eleitores. Não há nenhuma segurança de que a outra banda dos aliados, do próprio PMDB e do DEM, se empenhará para discutir e votar as reformas no menor tempo possível.
Nesse puxa-estica, fica encoberto o debate essencial sobre quais as mudanças que atendem a necessidades mais permanentes do País, e não apenas imposições do momento econômico. No caso da reforma trabalhista, essas nuances ficam ainda mais visíveis. É óbvio que a CLT, dos anos 40, não responde mais à realidade do mercado, sacudido pela revolução tecnológica. A questão é o que pôr no lugar da velha senhora CLT. O governo já se manifestou a favor de uma reforma que privilegie a livre negociação entre empregados e empregadores em lugar da rigidez da legislação. Mas essa premissa é muito pouco para definir como vão funcionar, na prática, as novas diretrizes. Ainda mais quando se leva em conta o desequilíbrio de forças entre empresas e trabalhadores, em tempos de recessão.
A própria Constituição já permite flexibilizar itens como jornada de trabalho, banco de horas e redução de salário - e isso tem aparecido, por exemplo, em acordos fechados pelas grandes montadoras com os sindicatos de metalúrgicos. Se vingar a proposta que circula no Planalto, a negociação poderia ir bem além, alcançando também benefícios como 13.º salário e férias, além do próprio FGTS. Há ainda a intenção de criar novas modalidades de contrato para jornadas parciais ou temporárias, com salários proporcionais.
Enquanto esse debate continua disperso, o governo decidiu acelerar a tramitação do projeto de terceirização, aprovado pela Câmara no início de 2015 e estacionado no Senado. O objetivo é entregar alguma coisa aos empresários, que insistem na urgência da redução dos custos trabalhistas. O projeto prevê a terceirização para qualquer tipo de atividade profissional - da chamada atividade-meio à atividade-fim.
Quem defende o projeto argumenta que as mudanças tecnológicas tornaram praticamente impossível separar atividade-fim de atividade-meio. Quem ataca diz que tudo vai acabar na precarização das relações de trabalho. Os dois lados têm suas razões, até porque o que importa não é se o trabalhador é ou não terceirizado, mas qual é o padrão de contratação da mão de obra.
Mais complexa fica a situação, diante da aparente insegurança do governo em assumir o alcance das mudanças. O próprio Temer prefere escapar da questão “manter ou não os direitos trabalhistas”, insistindo em que o objetivo da reforma é “criar empregos”. O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, já garantiu que os direitos não serão eliminados, mas “aprimorados”.
É inegável que ser mais explícito nesses temas pode incendiar o debate logo de saída. Afinal, enquanto fala em flexibilizar direitos trabalhistas, o governo continua enredado no imbróglio dos reajustes salariais prometidos aos ministros do Supremo Tribunal Federal, visto por muitos como mais um privilégio para o topo da pirâmide. Sempre resta o argumento de que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. A conferir se Temer e sua equipe terão condições de baixar a temperatura e organizar as negociações.
Fonte: Estadão