O número de empregados com carteira assinada no Brasil aumenta desde 2000. Nesses quase 12 anos, o mercado formal absorveu 14,7 milhões de pessoas, o que resultou em avanços na qualidade de vida da população, em uma significativa ampliação da classe média e, consequentemente, no desenvolvimento de um novo e cobiçado público consumidor. No entanto, essa expansão do emprego ocorreu de forma desigual em termos de salário: os novos postos de trabalho se concentraram em vagas de baixa remuneração, que pagam no máximo dois salários mínimos mensais – o equivalente, hoje, a R$ 1.090. Para quem pensa em ingressar numa empresa ganhando mais que isso, o mercado encolheu.
Segundo dados levantados pela Gazeta do Povo na base on-line do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), entre janeiro de 2000 e outubro de 2011 o país criou 18,5 milhões de empregos de até dois mínimos e, em sentido oposto, fechou 3,8 milhões de vagas mais bem remuneradas. Coordenado pelo Ministério do Trabalho, o Caged registra as contratações e demissões de trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) – não inclui, portanto, militares e funcionários públicos estatutários.
A retração do mercado para faixas salariais mais altas não é um fenômeno novo. Mas chama atenção o fato de que ele persiste, indiferente ao aquecimento da economia, à disputa cada vez mais acirrada por profissionais e aos sintomas de “apagão” de mão de obra em alguns setores. As empresas até contratam trabalhadores por mais de dois salários. O problema é que, no conjunto da economia, as demissões nessa faixa salarial superam as admissões, o que torna negativo o saldo de empregos – em outras palavras, há um fechamento de postos de trabalho.
Entre janeiro e outubro de 2011, as empresas brasileiras admitiram 2,7 milhões de pessoas por uma remuneração superior a dois mínimos, mas dispensaram 2,86 milhões de funcionários nessa condição. Ou seja, em dez meses, foram extintas cerca de 160 mil vagas nessa faixa salarial. Quem está garantindo o crescimento do emprego formal são os postos mais “baratos”: com 14,84 milhões de contratados e 12,76 milhões de demitidos, o saldo das vagas de até dois salários ficou positivo em 2,08 milhões. A situação não é diferente no Paraná, onde o mercado gerou 156 mil empregos de até dois salários e fechou 14 mil postos mais “caros”.
Mesmo profissionais com ensino superior completo têm sido contratados para receber menos de dois salários. De janeiro a outubro, quase 77 mil brasileiros formados aceitaram trabalhar recebendo até 1,5 mínimo, o equivalente a R$ 817,50 – para efeito de comparação, em Curitiba há anúncios oferecendo salário de R$ 800 para empregados domésticos.
Setores
De uma lista de sete grandes setores da economia brasileira, apenas administração pública e serviços criaram vagas de remuneração superior a R$ 1.090 neste ano. Mesmo assim, em número limitado: dos 806 mil empregos criados por empresas prestadoras de serviços, apenas 33 mil pagam acima desse valor. Na administração pública, a divisão foi mais equilibrada: 10 mil das 28 mil vagas abertas estão na faixa de cima. Dentro do setor industrial, só a indústria extrativa mineral (7 mil vagas, de um total de 17 mil novos empregos) e a de veículos (441 de 27,4 mil) geraram postos de maior valor.
Mínimo subiu 60% mais que inflação desde 2001
Um dos fatores que explicam a expansão das vagas de até dois salários mínimos e a extinção de postos mais bem pagos está na forte valorização do salário mínimo. “Ganhar dois mínimos hoje significa receber muito mais, em termos reais, que há dez anos”, diz José Márcio Camargo, economista da Opus Gestão de Recursos e professor da PUC-Rio.
Entre 2001 e 2011, o valor do mínimo triplicou, passando de R$ 180 para R$ 545, aumento quase 60% superior ao da inflação do período. Com isso, aumentou o número de pessoas que recebem até dois salários – o equivalente a R$ 360 há dez anos e a R$ 1.090 hoje. Em 2012, o benefício subirá quase 15%, novamente acima da inflação, para R$ 625, segundo a última estimativa do governo.
O economista Fábio Romão, da LCA Consultores, lembra que o aumento da formalização, sobretudo a partir de 2004, incluiu nos dados do Caged um grande contingente de trabalhadores de baixa remuneração. “A inclusão de trabalhadores até então informais engordou a base da pirâmide salarial do emprego formal.”
Para Camargo, da PUC-Rio, outra explicação está em uma mudança estrutural vivida pela economia brasileira. “O setor mais dinâmico da economia nos últimos anos tem sido o de serviços. E ele tende a pagar salários mais baixos que a indústria, que vem perdendo força.”
Diferença natural
Há, ainda, o fato de que o salário dos recém-contratados é, em geral, inferior ao dos que perdem o emprego. “Essa diferença é natural. Ruim é quando ela aumenta, algo que não tem ocorrido”, diz Cid Cordeiro, economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese-PR). Para ele, a rotatividade como estratégia de contenção de gastos – a troca trabalhadores “caros”, com mais tempo de casa, por outros mais jovens e “baratos” – ainda existe, mas “diminuiu muito”. “Boa parte da rotatividade se deve hoje ao trabalhador, que pede demissão para trabalhar em outro lugar, por salário melhor.”
Fonte: Site; Jornal Gazeta do Povo, (12/12/2011).